Apesar das inúmeras campanhas e associações que tentam combater diariamente o aumento do número de mulheres vítimas de violência doméstica, esta é uma realidade que insiste em permanecer no nosso país, e a região dos Açores não é excepção.
Na semana em que se celebra o Dia Internacional da Mulher, a 8 de Março, a Lusa/Ilha Maior falou com a associação nacional da União da Mulher – Alternativa e Resposta (UMAR) e com uma vítima que teve a coragem de contar publicamente a sua história.
De acordo com dados estatísticos da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima (APAV), em 2008 foram contabilizados 18.669 crimes em Portugal, dos quais 90 por cento são referentes a casos de violência doméstica, sendo a maioria das vítimas de sexo feminino.
A UMAR é uma associação que defende a igualdade e os direitos das mulheres a nível nacional, da qual faz parte a Casa Abrigo, que acolhe diariamente vítimas de violência doméstica desde Outubro de 2005. Aqui recebem alojamento, alimentação, segurança, acompanhamento diário e apoio jurídico, psicológico e social.
Ana (nome fictício) tem 22 anos e foi vítima de violência doméstica durante dois anos. Natural do concelho das Lajes do Pico, a jovem foi acolhida pela Casa Abrigo há cerca de seis meses.
A história de Ana pode ser igual a tantas outras, mas “quando se tem filhos o medo é maior”. Jovem, desempregada e com uma filha de um ex-namorado, Ana namorou durante seis meses e juntou-se com o parceiro de 23 anos de idade, que vivia com os pais no Faial. Apesar desta união ter nascido uma criança, “os tempos foram difíceis” a partir do momento em que Ana foi viver com ele. Segundo contou a jovem, a agressividade surgia “quando ele bebia demais”. O álcool foi a razão pela qual Ana sofreu durante dois anos de violência doméstica, a qual era do conhecimento dos pais e irmãos do agressor. “Uma pessoa nem se podia aproximar quando ele bebia, não ouvia ninguém”, disse, acrescentando que chegou a ser hospitalizada, “mas nas meninas ele nunca tocou”.
Ana não trabalhava porque “ele dizia que não era preciso”. Chegou a fazer duas queixas na polícia, mas o receio levou-a a retirá-las de imediato. “Farta desta vida”, a jovem decidiu recorrer à associação UMAR e, com a ajuda de uma das funcionárias, fugiu de casa numa tarde. “Tive de esperar que a mãe dele adormecesse, porque se soubesse não me deixava sair”, contou.
“Aqui sinto-me segura, mas ele sabe onde estou e já cá veio bater à porta”, disse a jovem, que tenta combater o medo diariamente.
Apesar das “falsas desculpas” do ex-companheiro, Ana garante que não volta para ele e que o seu futuro é no Pico junto da sua família.
“Custa-me muito olhar para o passado e o que mais receio na vida é que as minhas meninas um dia sofram aquilo que eu sofri”, disse.
Ana deixa uma mensagem a todas as mulheres que estejam a passar por tudo aquilo que ela passou: “Façam logo queixa, peçam ajuda, porque depois da primeira vez, vêem muitas mais”.
Segundo dados estatísticos fornecidos pela UMAR, a faixa etária mais comum entre as vítimas atendidas no centro de atendimento da associação, que funciona desde Maio de 2002, situa-se entre os 31 e os 40 anos de idade (33%), seguindo-se a faixa etária dos 41 aos 50 anos (25%) e dos 21 aos 30 anos (19%). Cerca de 71 por cento das vítimas são naturais do Faial, mais de 23 por cento são do Pico e de São Jorge são apenas 5 por cento.
Relativamente à faixa etária das vítimas acolhidas na Casa Abrigo, cerca de 42 por cento tem entre 31 e 40 anos de idade, seguindo-se a faixa etária dos 21 aos 30 anos (26%) e dos 41 aos 50 anos (16%).
A naturalidade da maioria das vítimas acolhidas é do Faial (45%) e do Pico (26%). Na casa residem ainda 6,5 por cento de vítimas naturais de São Miguel, Terceira e Flores, sendo as restantes naturais de São Jorge e do continente.
Em termos de habilitações literárias, cerca de 40 por cento das vítimas tem apenas o ensino primário. Apenas 39 por cento das vítimas trabalhava antes de entrar na Casa Abrigo, das quais 58 por cento recebia o ordenado mínimo nacional.
Em termos familiares, autor de crime e vítima são cônjuges ou companheiros em mais de 80 por cento dos casos.
Mais de 90 por cento das vítimas acolhidas são mães, tendo um (39%), dois (29%), três (13%) ou mais filhos (10%). A Casa Abrigo acolhe 93 por cento das mães com filhos, residindo na casa 15 crianças menores.
Enquanto vítimas de violência doméstica, a maioria das vítimas apresentou queixa contra o agressor e mais de 37 por cento recorreram ao hospital depois das agressões.
Filipa Rosa - Agência Lusa & Jornal Ilha Maior - Março 2009
sexta-feira, 1 de janeiro de 2010
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